domingo, 20 de setembro de 2015

O MISTÉRIO DE CRISTO


Deus, que tem um cuidado paternal para com todos, quis que todos os homens formassem uma só família e se tratassem mutuamente com espírito fraterno.Todos, com efeito, criados à sua imagem de Deus que “fez de um, todo o gênero humano habitar sobre a face da terra” (At 17,26), são chamados para um único e mesmo fim, que é o próprio Deus (GS 24). O homem é, com efeito, por sua natureza íntima, um ser social. Sem relações com os outros, não pode nem viver, nem desenvolver seus dotes (GS 12); desenvolve-se em todas as suas qualidades mediante a comunicação com os outros, pelas obrigações mútuas, pelo diálogo com os irmãos  e assim pode corresponder à sua vocação de filho de Deus (GS 25).
Mas, a razão principal da dignidade humana, sua, por assim dizer, primeira dimensão, consiste na vocação do homem para a comunhão com Deus. Já desde sua origem o homem é convidado para o diálogo com Deus. Pois o homem, se existe, é somente porque Deus o criou e isto por amor. Por amor é sempre conservado. E não vive plenamente segundo a verdade, a não ser que reconheça livremente aquele amor e se entregue ao seu Criador (GS 19). O homem é chamado por Deus principalmente à própria comunhão com Deus como filho e à participação de sua felicidade (GS 21)
Atinge o homem essas suas autênticas dimensões de filho de Deus pela sua dinâmica humana, maravilhosamente enriquecida pelo Deus do amor, constante de valores de natureza física, psíquica, intelectual e moral, desiguais, portanto, entre si, mas harmoniosamente e hierarquicamente ordenados, pela sabedoria de Deus, dos quais os máximos são o amor, a amizade, a oração e a contemplação (“Populor progressio”, n.20).
É no reconhecimento de seus valores integrais, no respeito da hierarquia ou da escala em que foram dispostos por Deus, que o homem, atingindo as autênticas dimensões de filho de Deus, realizar-se-á a si mesmo, correspondendo assim à sua vocação para a felicidade, na participação da felicidade do próprio Deus.
Assim é o homem, filho de Deus, como Deus o quis e o criou (Ecl 17,1-11).Esta reflexão teológica sobre a realidade original do homem não pode  absolutamente omitir-se, sob pena de esvaziarmos a história da salvação de seu verdadeiro sentido, tornando inaceitável ao homem de hoje (pois é deste que estamos tratando), Cristo Jesus e consequentemente, a sua Igreja.
De fato, a situação atual em que se encontra o homem é realidade bastante diferente daquela a que nos levou a reflexão teológica, quando não a ela diametralmente oposta, cujo profundo sentido foi magistralmente revelado pelo Vaticano II: “O homem,olhando o seu coração, descobre-se também inclinado para o mal e mergulhado em múltiplos males que não pode provir do seu Criador, que é bom. . . o homem destruiu a devida ordem em relação ao fim último e, ao mesmo tempo, toda a sua harmonia  consigo  mesmo, com os outros homens e as coisas criadas. Por isso o homem está dividido em si mesmo. Por esta razão, toda a vida humana, individual e coletiva, apresenta-se como uma dramática luta entre o bem e o mal, entre a luz e as trevas. Bem mais ainda. O homem se encontra incapaz, por si mesmo, de debelar eficazmente os ataques do mal; e assim cada um se sente como que carregado de cadeias”(GS 13). À luz da reflexão teológica, o pecado que aflige a cada indivíduo humano desde o seu nascimento e a toda a sociedade por ele formada com todos os seus condicionamentos está na incapacidade de responder por suas próprias forças à sua vocação fundamental de filho de Deus.
Neste contexto que condiciona  toda a história da humanidade, como um todo e em cada um dos seus membros, em todos os tempos, é que se insere e age o mistério de Cristo.
Coube à fé esclarecer todas as coisas com luz nova, manifestar o plano divino sobre a vocação integral do homem. Por isso orienta a mente para soluções plenamente humanas (GS 11).
Mais uma vez, em hora oportuníssima e em termos inequívocos, Deus Pai, pelo Espírito, glorificou seu Filho. Pelo testemunho profético da Igreja, proclamado ao mundo dos homens e das coisas, no Vaticano II, o pai conclama todos os homens, sociedade e indivíduos, de todos os continentes, a voltarem-se para Cristo Jesus, o Homem-Filho de Deus, a verem nEle a revelação encarnada do autêntico Homem, com todos os valores e dimensões em plenitude e, por conseguinte, tipo único e exclusivo do homem-filho de Deus, realizado em sua vocação integral.
Na realidade o mistério do homem só se torna claro verdadeiramente no mistério do Verbo encarnado. Com efeito, Adão, o primeiro homem, era figura daquele que haveria de vir, isto é, do Cristo Senhor. Novo Adão, na mesma revelação do mistério do  pai e de seu amor, Cristo manifesta plenamente o homem ao próprio  homem e lhe descobre sua altíssima vocação. Não é, portanto, de se admirar que em Cristo estas verdades encontrem sua fonte e atinjam seu ápice”.(GS 22).
A missão da Igreja em todos os continentes é dar Cristo ao homem para ele ser homem e mais homem (“Populorum Progressio”, n.16).
Dar Cristo ao homem, não significa, para a Igreja, transmitir-lhe somente a doutrina evangélica, propor-lhe os exemplos de Cristo, mas antes e sobretudo, incorpora-lo a Cristo vitalmente, para que, unido misteriosamente, mas realmente, a Cristo, se difunda nele a própria vida de Cristo (LG.7),“ Pregando o Evangelho, a Igreja atrai à fé e à confissão da fé os ouvintes, dispõe-nos ao batismo, arranca-os da escravidão do erro e incorpora-os a Cristo, para que através da caridade cresçam nEle até à plenitude” (LG 17).A Igreja, sociedade divinamente constituída, é o meio para o homem encontrar-se com Cristo Jesus e n’Ele com o Pai, com os irmãos, consigo mesmo e com o universo e viver este encontro “humanizante”, vital, que o constitui filho de Deus (LG 2,7,8,etc).
A mensagem da Igreja seria inoperante e ineficaz, se consistisse somente em ensinar aos homens a doutrina evangélica, em dela deduzir os princípios e meios para a felicidade do homem de todos os continentes.
A Igreja sabe (e demonstrou-o pelo Vaticano II) que sua mensagem é o próprio Cristo Jesus, Filho de Deus e da Virgem Maria, insubstituível, verdadeira vide, que dá vida e fecundidade nos ramos, quer dizer, a nós que pela Igreja permanecemos n’Ele e sem o qual nada podemos fazer” (LG 6).
† Dom Gabriel Paulino Bueno Couto, O.C - Servo de Deus